Prefácio
Há
cerca de 2000 anos, nascia na Galiléia um fundador de seita, que acabaria
crucificado uns trinta anos mais tarde. Algumas de suas últimas palavras na
cruz foram "Dêem-me de beber". E só. A seita que ele tinha fundado
tornar-se-ia, com o passar dos anos, a maior de todos os tempos. Ela tomará o
poder político dentro do Império Romano, abolirá a liberdade de religião,
depois ajuntará montanhas de cadáveres: os seus membros massacrarão milhões
de "infiéis", "hereges", "feiticeiras" e outros,
depois se matarão entre eles próprios, levando a Europa às guerras mais
ferozes que ela conheceu. Um passado destes poderia incitar à modéstia, mas os
cristãos reivindicam, pelo contrário, o monopólio da ética. Proclamam que
adoram o Deus único, que deus é "amor", e se consideram melhores que
o resto da humanidade.
Única
ideologia capaz de dividir com o comunismo e o nazismo o pódio dedicado às
ideologias mais mortíferas da história humana, o cristianismo mantém-se uma
ideologia dominante em muitos países ocidentais, como o "gendarme do
mundo", os EUA. Chegou a hora de abrir o "Livro Negro do Cristianismo:
2000 anos de terror, perseguições e repressão", que resume algumas das
piores atrocidades cometidas em nome dessa ideologia que pretende promover o
amor ao próximo.
Ano
um
"Os
deuses não estavam mais, e Deus não estava ainda."
O Império Romano garantia a liberdade de culto. O ateísmo e a razão
dominavam. É nessa época que nasce um sujeito que, segundo dizem certos
judeus, perdeu o juízo porque leu o Tora demasiadamente jovem. Ele funda uma
seita que visa proibir o culto dos outros deuses, exceto o seu. O sujeito é
finalmente morto, mas a seita se expande com o êxito que se conhece.
O
culto da personalidade do fundador da seita atinge, nos cristãos, um nível que
mesmo o estalinismo não conseguirá igualar: o fundador é proclamado
"verdadeiro homem e verdadeiro Deus", ("Deus-Homem", em
linguagem comum).
Os que duvidam disso são proclamados imediatamente hereges, e
sofrerão mais tarde os raios da Inquisição. A partir do século IV da nossa
era, começará o assassinato dos não-crentes pelos cristãos.
Anos
50-70
A
seita cristã se desenvolve. Textos gregos, escritos por membros da seita fora
da Palestina ("Os evangelhos") relatam a vida do fundador: nascido
duma virgem, que se manterá virgem mesmo tendo vários outros filhos, ele terá
sarado doentes, mas também amaldiçoa uma figueira que fica instantaneamente
seca, e fará precipitar num lago centenas de porcos que lhe não pertenciam.
Este personagem, que defende os pobres mas também afirma que "aqueles que
têm tudo serão louvados, e àqueles que nada têm, o pouco que têm ser-lhe-á
retirado", um pouco patético quando amaldiçoa uma figueira ou se deixa
crucificar, é declarado a incarnação do "Deus único". O fato de,
segundo os evangelhos "canônicos", as suas últimas palavras sobre a
cruz terem sido "Dai-me de beber" não parece perturbar os adeptos da
seita, que se expande por todo o Império.
A
intolerância religiosa dos cristãos, que visam abertamente, desde o início,
impor uma interdição aos cultos de deuses que não o seu, o qual eles insistem
ser o "único Deus", começa logo a atrair a atenção da justiça
romana, que defende a liberdade de culto, a qual é um dos pilares dessa
sociedade complexa e multicultural que é o Império Romano dos primeiros
séculos da nossa era. A propaganda cristã inverte habilmente a situação. Os
condenados pela justiça romana são declarados "mártires" e os seus
restos são venerados nas igrejas, inventando-se a lenda de eles terem sido
executados por terem "recusado a renegar a fé", desculpa essa bem
melhor do que a verdade nua, que mostra que foram condenados por desordem e
imposição da intolerância religiosa na sociedade multicultural.
Ano
312
Tomada
do poder pelos cristãos. No fim duma guerra civil, Constantino toma o poder.
Pouco depois ele se converte oficialmente ao cristianismo, e
"autoriza", num primeiro tempo, o culto do deus único cristão, pelo
Édito de Milão: é o início da perseguição religiosa na Europa. Pouco a
pouco o culto dos outros deuses, exceto o deus cristão, vai sendo proibido. Os
santuários clássicos serão destruídos ou transformados em igrejas cristãs.
No fim do século IV, não haverá mais nenhum templo pagão em toda a bacia do
Mediterrâneo.
Ano
de 380
O
imperador Teodósio proclama oficialmente o Cristianismo a única
"Religião de Estado". Mas ainda será necessário esperar mais 12
anos para que todos os outros cultos sejam definitivamente proibidos.
Ano
de 389
Teófilo,
hoje Santo Teófilo, é nomeado patriarca de Alexandria e inicia imediatamente
uma violenta campanha de destruição de todos os templos e santuários
não-cristãos. Tem o apoio do pio imperador Teodósio. Deve-se a Teófilo a
destruição, em Alexandria, dos templos de Mitríade e de Dionísio. Essa
loucura destruidora culmina em 391 com a destruição do templo de Serapis e da
sua biblioteca. As pedras dos santuários destruídos serão usadas para
edificar igrejas para a nova religião única, a cristã.
Em
seguida e para demonstrar que ele é capaz de perseguir também cristãos (na
medida em que eles não sejam 100% ortodoxos), Teófilo comanda pessoalmente as
tropas que atacam e destroem os mosteiros que aderiram às idéias de Orígeno,
um teólogo cristão que foi declarado herege porque afirmava que deus era
puramente imaterial.
Ano
de 389
Pela
primeira vez, um chefe cristão dita a um imperador, a política a ser seguida:
Santo Ambrósio de Milão, levanta-se em plena catedral, e com o sentido de
caridade tão particular aos cristãos, impõe que o imperador anule a ordem que
dera ao bispo de Calinicum, sobre o Eufrates, para que reconstruísse uma
sinagoga que ele e a sua congregação tinham destruído. A igreja toma partido
assim, desde o princípio, dos incendiários de sinagogas, posição que
continuará a manter até ao ano de 1940.
Início
dos anos 390
O
piedoso imperador cristão Teodósio interdita progressivamente todos os cultos
não cristãos. Pouco a pouco, os templos não cristãos são fechados ao culto,
as procissões "pagãs" são proibidas. Esta supressão da liberdade
de religião, em proveito exclusivo do cristianismo, causa por vezes revoltas,
como a de 408, em Calama, na Numídia. É nessa época que acontecem na
Germânia as primeiras execuções de hereges, uma bela tradição que a igreja
desenvolverá com a Inquisição e a perpetuará até 1826.
Ano
de 391
Uma
multidão de cristãos, guiados por Santo Atanásio e Santo Teófilo, deitam
abaixo o templo e a enorme estátua de Serapis, em Alexandria, duas obras-primas
da antigüidade. A coleção de literatura do templo também é igualmente
destruída.
Ano
de 412
Cirilo,
hoje Santo Cirilo, doutor da Igreja, é nomeado bispo de Alexandria e sucede a
seu tio Teófilo. Excita os sentimentos anti-semitas difundidos entre os
cristãos da cidade e, à frente duma multidão de cristãos, incendeia as
sinagogas da cidade e faz fugir os judeus. Em seguida encoraja os cristãos a
tomar os bens dos fugitivos, deixados para trás.
Ano
de 415
Hepatia,
a última grande matemática da Escola de Alexandria, filha de Theon de
Alexandria, é assassinada por uma multidão de monges cristãos, incitados por
Cirilo, patriarca de Alexandria, que será depois canonizado pela Igreja. O
motivo dessa ação foi que a brilhante professora de matemática, representava
uma ameaça para a difusão do cristianismo, pela sua defesa da Ciência e do
Neoplatonismo. O fato dela ser mulher, muito bela e carismática, fazia a sua
existência ainda mais intolerável aos olhos dos cristãos. A sua morte marcou
uma reviravolta: após o seu assassinato, numerosos pesquisadores e filósofos
trocaram Alexandria pela Índia e pela Pérsia, e Alexandria deixou de ser o
grande centro de ensino das ciências do mundo antigo. Além do mais, a Ciência
retrocederá no Ocidente e não atingirá de novo um nível comparável ao da
Alexandria antiga senão no início da Revolução Industrial. Os trabalhos da
Escola de Alexandria sobre matemática, física e astronomia serão preservados,
em parte, pelos árabes, persas, indianos e também chineses. O Ocidente, pelo
seu lado, mergulha no obscurantismo, do qual começará a sair mais de um
milênio depois. Em reconhecimento pelos seus méritos de perseguidor da
comunidade científica e dos judeus de Alexandria, Cirilo será canonizado e
promovido a "Doutor da Igreja", em 1882.
Séculos
V a XV
A
"Idade Média Cristã". Aproveitando o desaparecimento das grandes
bibliotecas romanas e na ausência quase total da atividade editorial na Europa,
a igreja obtém, de fato, um monopólio sobre o conjunto da escrita e da
informação. O povo é deixado propositadamente na ignorância, a leitura da
Bíblia é desencorajada mesmo no caso de se ter acesso a um exemplar. Pouco a
pouco, a igreja impõe o seu domínio sobre a sociedade. A inquisição, o
celibato dos padres, o caracter obrigatório de casamento antes de qualquer
relação sexual, são todas instituições que datam dessa época. É também
nessa época que se desenvolve o que se tornará uma das mais ricas tradições
cristãs: queimar pessoas vivas. Cerca de um milhão de "bruxos"
serão torrados durante a Idade Média. As cidades concorrerão para tentar
bater recordes de quantidade de bruxos queimados por ano. Um recorde imbatido
foi estabelecido pela cidade de Bamberg, sede do episcopado, que conseguiu assar
600 feiticeiros num só ano.
Um
grande número de membros da igreja atual ainda lamenta o fim dessa época,
quando a igreja dominava totalmente a vida social. Religiosos (e outros)
cristãos lembram com saudade, a "espiritualidade" da época, a arte
que deu grande ênfase à morte - assunto que sempre apaixonou os cristãos, e a
música envolvente.
Ano
de 804
O
imperador cristão Carlos Magno converte grande número de saxões,
propondo-lhes a seguinte escolha: converter-se ao catolicismo ou serem
decapitados. Vários milhares de cabeças caem, com a bênção da igreja: os
sacerdotes presentes participam da jogada do imperador.
Século
IX
Cisma
do oriente. O patriarca de Constantinopla pretende que se deve utilizar o pão
com levedura, para a Eucaristia. O Papa, bispo de Roma, afirma que se deve usar
pão sem levedura. Com base neste problema de capital importância, a
cristandade se divide, e os dois patriarcas, de Roma e de Constantinopla, se
excomungam mutuamente. O Cisma vai provocar mortes até aos anos 90 (guerras nos
Balcãs, ex-Iugoslávia, de católicos contra ortodoxos).
Ano
de 1182
Os
"pogroms" latinos de Constantinopla. Na cidade do piedoso patriarca
que come pão levedado, estabeleceu-se, desde o início de século XII, uma
colônia de mercadores "latinos", essencialmente originários de
Veneza, Génova, Pisa e Amalfi. Mas essas pessoas têm tudo para desagradar aos
prelados ortodoxos: além de utilizarem o pão sem levedura para a Eucaristia,
fazem o sinal da cruz no sentido errado, da esquerda para a direita e não da
direita para a esquerda! Os popes excitam a populaça e enfim, nos dias radiosos
de maio de 1182, a multidão guiada pelos popes pegam os latinos: vários
milhares deles, homens, mulheres e crianças são trucidados.
Séculos
XI e XII
Em
face do crescimento da população da Europa, a Igreja propõe um método de
controle populacional "natural": as cruzadas. O apelo às cruzadas foi
lançado em 1095. Em 1099 Jerusalém é "libertada": logo que as
tropas cruzadas entraram na cidade, o governador muçulmano rendeu-se sob a
promessa da população civil ser poupada. Claro, a totalidade da população
(que compreende essencialmente judeus e muçulmanos) é passada pelas armas nas
horas seguintes, mas com o cuidado de antes violentar todas a mulheres e
decapitar as crianças. Estima-se em 70.000 o número de civis massacrados. A
última fase do massacre passa-se nas sinagogas e mesquitas da cidade, onde os
habitantes aterrorizados se refugiaram: pensam que o caracter religioso dos
locais possam inspirar os piedosos cruzados à clemência. Nada disso acontece:
os cruzados entram e transformam os locais de culto em vastas carnificinas. O
massacre de milhares de civis amontoados na grande mesquita da esplanada do
templo dura várias horas. "Tudo o que respira" na cidade foi morto,
informam com orgulho os comandantes dos cruzados.
Ano
de 1204
A
4a Cruzada fez uma parada em Constantinopla, na época a maior
cidade cristã. Mas os cristãos sabem fazer entre eles o que fazem aos outros:
durante três dias, Constantinopla foi posta a saque, com uma orgia de
violências indescritíveis.
Anos
de 1208 a 1244
Cruzada
dos Albigences: por iniciativa do papa Inocêncio III, uma cruzada é preparada.
Em 1209, como alguns "hereges" se haviam misturado com a população de Beziers, o duque Simon de Monfort deu uma ordem que lhe assegurou a posteridade: "Matem-nos todos, deus reconhecerá os seus". Toda a população, homens, mulheres e crianças são passados pelas armas. A Provence e a região de Toulouse ficam muito despovoadas após essa guerra que é dirigida contra a população civil, com uma ferocidade sem precedentes desde as invasões bárbaras.
Em 1209, como alguns "hereges" se haviam misturado com a população de Beziers, o duque Simon de Monfort deu uma ordem que lhe assegurou a posteridade: "Matem-nos todos, deus reconhecerá os seus". Toda a população, homens, mulheres e crianças são passados pelas armas. A Provence e a região de Toulouse ficam muito despovoadas após essa guerra que é dirigida contra a população civil, com uma ferocidade sem precedentes desde as invasões bárbaras.
Anos
de 1226 a 1270
Luís
IX, rei de França. Finalmente um católico, de reputação piedosa e íntegra,
acede à coroa de França. A igreja o canoniza em 1290, em reconhecimento de
seus méritos que, ninguém duvida serem excepcionais. De fato, durante o seu
reinado, São Luís lança duas cruzadas, que terminam as duas de modo
catastrófico: pouco importa, é a intenção (de matar e de pilhar) que conta,
aos olhos da misericordiosa igreja católica! No plano interno, São Luís
faz de modo que a justiça puna de modo sistemático os blasfemeadores: são
postos nos pelourinhos e têm as suas línguas atravessadas por ferros em brasa.
Ano
de 1231
Fundação
da Inquisição. O Santo Ofício, durante toda a sua história, queimou mais de
um milhão de pessoas, essencialmente hereges, judeus e muçulmanos convertidos
e também os "bruxos". A última feiticeira será queimada em 1788. O
último "herege" chegará à sua vez em 1826. A inquisição e os seus
imitadores protestantes queimam também médicos e cientistas, desde que haja
uma oportunidade.
A
igreja nunca se arrependeu dos atos da Inquisição e até garantiu a
continuidade histórica da instituição até aos nossos dias, limitando-se
apenas a mudar-lhe o nome: será necessário esperar que Pio X, em 1906, faça
que o "Santo Ofício da Inquisição" seja renomeado como "Santo
Ofício", e em 1965, para que seja rebatizado como "Congregação para
a doutrina da fé". Enfim em 1997, o papa abre os arquivos do Santo
Ofício, e historiadores escolhidos a dedo, são autorizados a fazer pesquisas.
As estimativas do número total de vítimas da inquisição são então revistas
para cima, havendo um consenso que roda hoje em torno de um milhão de pessoas
executadas, ao qual é necessário acrescentar as inúmeras pessoas torturadas e
com todos os seus bens apreendidos.
Ano
de 1251
O
papa Inocêncio IV autoriza enfim a inquisição a praticar a tortura. A
obtenção das confissões de culpa é grandemente facilitada. A inquisição
pode aplicar, com base em confissões arrancadas através de tortura, penas indo
duma simples oração ou dum jejum até à confiscação dos bens e mesmo
prisão perpétua. Mas ela não pode condenar à morte. Com a subtileza
característica da igreja católica, a inquisição podia "passar" um
herege para a justiça comum, que o levará à morte na fogueira, com base na
confissão obtida pela igreja, mesmo com tortura. Essa subtilidade permitirá à
igreja afirmar que ela nunca matou ninguém...
Anos
1347 a 1354
Em
toda a Europa reina a Morte Negra, a primeira grande epidemia de peste no
continente. Os prelados católicos logo descobriram os culpados: os judeus
teriam envenenado os poços de água. Esse boato espalha-se por toda a Europa e
inúmeros "pogroms" acontecem. Na Alemanha contam-se 350 comunidades
judias totalmente destruídas pelos "pogroms", nesse período. Na
Itália, em Milão, as autoridades civis e eclesiásticas, depois de terem
executado no braseiro os "untori" judeus, inauguraram uma coluna
comemorativa para lembrar o seu feito. Essa coluna passou à História com o
nome de "Coluna infame", quando, no século XIX , o romancista Manzoni
teve, em primeira mão, a coragem de denunciar esse monumento à perversão
religiosa.
Ano
de 1483
Tomás
de Torquemada é nomeado Grande Inquisidor de Castela. Esse monge dominicano faz
uma ampla utilização da tortura e da confiscação dos bens das vítimas.
Estima-se em 20.000 o número de pessoas queimadas durante o seu mandato.
Ano
de 1487
Dois
monges dominicanos alemães, Jacob Sprenger e Heinrich Institoris publicam o
"Malleus Malleficarum": trata-se dum espesso volume de 400 páginas
que é um guia (claro que aprovado pela hierarquia católica) de caça às
bruxas. Lá se pode aprender a identificá-las (p. ex. se uma mulher acariciar
um gato preto e a centenas de metros alguém se sentir mal, etc), a torturá-las
para as fazer confessar, e como os inquisidores podem se absolver mutuamente,
depois duma sessão de tortura. A obra afirma também que negar a existência da
feitiçaria é uma heresia muito grave, passível de morte na fogueira. Durante
dois séculos e meio, na Alemanha, depois da publicação do Malleus
Malleficarum, negar a bruxaria podia levar ao braseiro. O manual foi um
"best-seller"...
Ano
de 1492
O
rei "muito católico" e a rainha "muito católica" (títulos
dados pelo papa em pessoa!) de Espanha, expulsam os judeus. Eles podem escolher
se converter, para então poderem ser justiçados pela inquisição (que
queimará grande número deles) ou partir. Mais de 160.000 judeus saíram da
Espanha. A hierarquia católica não fica indiferente a essa medida duma
crueldade assustadora: ela aprova a medida, e o papa encoraja os outros
soberanos europeus a se inspirarem no exemplo espanhol. Em toda a Europa os
padres católicos se mobilizam para obrigar os governos a proibir a entrada dos
judeus expulsos.
Os
judeus que escolheram se converter são perseguidos pela inquisição com uma
impressionante determinação: até ao século XVIII, far-se-á o "Teste da
banha de porco" aos judeus convertidos e seus descendentes: uma salada com
pedaços de carne e banha de porco é apresentada ao "convertido". Se
for notado que ele não comeu a carne suína, será queimado como "falso
convertido". Esse método será também aplicado aos muçulmanos e seus
descendentes.
Se
a expulsão dos judeus de Espanha foi a maior do gênero registrada na
História, não foi a primeira. Na França, os prelados católicos tinham já
conseguido a expulsão dos judeus em 1306, e que foi logo revogada, antes de ser
confirmada em 1394. A Inglaterra já tinha procedido à expulsão em 1290. Em
1496, Portugal imita o seu poderoso vizinho, expulsando também os judeus.
Ano
de 1493
O
primeiro índio da América no paraíso. Quando Cristóvão Colombo, que teve o
cuidado de levar um monge nas bagagens, chega à América, ele encontra os
índios que ele descreverá como gente amigável e solícita. Prende 12 deles e
os leva para Espanha. À chegada, um deles fica doente: antes da sua morte, é
batizado rapidamente, o que permite a corte dos muito católicos reis exultar,
porque um indígena do Novo Mundo acabava de entrar no paraíso cristão. Esta
triste história marcará o início da trágica cristianização dos índios
americanos, onde os episódios dos redutos do Paraguai e as perseguições aos
índios Pueblo serão alguns dos mais trágicos.
Ano
de 1499
Acontece
neste ano o maior "auto da fé", que a História registra. Em um só
auto de fé, o inquisidor Diego Rodrigues Lucero queima vivos nada menos que 107
judeus convertidos ao cristianismo, em Córdova.
Século
XVI
O
drama dos castrados. A igreja, que tinha proibido que mulheres cantassem no
coral das igrejas, enfrenta um problema trágico: como não torturar os ouvidos
dos piedosos prelados de cristo, privando-os das vozes sopranas, tão
importantes nos coros para louvar o amor a deus? Uma solução bárbara é
encontrada: castrar jovens meninos cuja voz tenha sido considerada bela. Nos
corais da Santa Igreja católica não faltarão assim nunca os sopranos e
contraltos...
Esta
prática bárbara só terminará em 1878, por ordem do Papa Leão XIII. Mas é
mantida ainda durante o século XIX, ao ponto de Rossini, quando ele compôs a
"Pequena missa solene", escrever, com naturalidade, que serão
suficientes para executá-la, "um piano e uma dúzia de cantores dos três
sexos, homens, mulheres e castrados".
Ano
de 1506
"Pogrom"
de Lisboa: 3000 judeus são trucidados pelos piedosos católicos, incitados
pelos prelados.
Século
XVI
Júlio
II della Rovere, papa. Hábil chefe militar, ele veste uma armadura durante a
missa, quando um monge insolente lhe diz que o traje não é conveniente.
"Quando se trata de conquistar terras, deus não faz questão do traje, mas
da fé do seu servidor", lhe responde, passando assim à História. Deus
lhe permitiu, de fato, conquistar a cidade de Bolonha, que foi, como deveria,
posta a saque.
Ano
de 1521
Inspirado
pelo Espírito Santo, que aparentemente não tinha que fazer, um monge alemão,
Martin Luther, traduz do latim o "Novo Testamento", em algumas
semanas. O diabo acaba de o tentar: Lutero não encontra coisa melhor a fazer do
que lançar sobre ele um tinteiro, que suja a parede. Essa mancha está
religiosamente preservada para os turistas do castelo de Wartburg.
O
acontecimento pareceria insignificante. Mas não é, pois ele inaugura o maior
cisma da cristandade: durante os séculos seguintes, os cristãos vão-se
massacrar mutuamente ainda com mais entusiasmo do que quando eles matavam e
queimavam os não-cristãos, os hereges, as bruxas, os judeus e muçulmanos
convertidos, etc.
Lutero
escreverá e dirá diversas vezes que era necessário queimar as sinagogas e
escorraçar os judeus das cidades: ele se situa assim dentro da tradição dos
pais da igreja católica, e que será mantida até ao século XIX pela
inquisição e depois no século XX pelos camisas castanhas (seguidores de
Mussolini).
Ano
de 1527
Saque
de Roma. Os soldados protestantes massacram a totalidade da população de Roma,
umas 40.000 almas, e pilham a cidade. O papa é salvo pelos guardas suíços.
Ele se fecha com eles no Castelo de Santo Ângelo, enquanto a população é
massacrada. Ele passou um grande medo. Os suíços ganham assim uma fama
profissional no estrangeiro, o que se perpetua até hoje.
Ano
de 1553
Calvino,
que condena os excessos da Igreja Católica, faz decapitar o livre-pensador e
médico Michel Servet, que havia descoberto a circulação sanguínea. Esse é
somente um dos 15 hereges que o reformador fez executar durante a sua ditadura
sobre Genebra.
Calvino
tem um papel muito ativo na prisão e depois na condenação à morte de Michel
Servet. Primeiro ele troca correspondência com ele e depois que o médico,
fugindo da inquisição, chega a Genebra, manda-o prender. Calvino havia dito a
seu amigo, o reformador Farel, que se Servet entrasse em Genebra, de lá não
sairia vivo. Ele manteve a sua promessa e interveio pessoalmente no julgamento
pedindo a sua execução. A única clemência dada a Servet foi de decapitá-lo
em vez de ser queimado vivo.
Ano
de 1571
A
invenção da imprensa permite que um número crescente de pessoas se informe. A
igreja reage criando o Índex (Index Additus Librorum Prohibitorum): essa
instituição editava regularmente a lista dos livros proibidos. A última
edição do índex foi publicada em 1961.
Anos
de 1566 a 1572
Pio
V, papa. Este santo da igreja católica, vangloria-se publicamente diversas
vezes de ter, durante a sua carreira de inquisidor, colocado fogo com suas
próprias mãos de mais de 100 fogueiras de hereges que ele mesmo acusara,
confundira e condenara.
Publica
também uma nova edição do catecismo oficial da igreja, no qual o amor ao
próximo e a misericórdia ocupam um lugar importante.
Anos
de 1547 a 1593
Guerras
de religião na França. As sub-seitas cristãs entregam-se a uma guerra civil
sem perdão, interrompida por diversas pazes e tréguas temporárias. Durante
uma delas, teve lugar o massacre de 20.000 protestantes, homens, mulheres e
crianças, numa só noite, a tristemente célebre Noite de S. Bartolomeu (1572).
Fim
do século XVI até ao início do século XVIII
Conversão
forçada dos índios Pueblo. Subindo pela costa do golfo do México, os
exploradores espanhóis, sempre acompanhados de monges e padres, entram em
contato com a tribo dos Pueblo, no território que hoje pertence ao estado
americano do Novo México: diferentes dos índios nômades das planícies do
Norte e doutros indígenas mais combativos que os espanhóis encontraram no
México e na América do Sul, os índios Pueblo vivem em aldeias (los pueblos)
de casas de tijolos com 2 ou 3 andares, são pacíficos e praticam a
agricultura. Seguem uma religião na qual se venera o "Pai do Céu" e
a "Terra Mãe", temem os demônios (os Skinnwalkers) que andam pela
crista das montanhas ao pôr do sol, veneram os corvos como reincarnação dos
seus antepassados. Eles têm também um rico templo de deuses semelhantes aos
dos gregos, sendo o seu deus principal a mulher-aranha. As cerimônias são
celebradas em pequenas igrejas familiares, as Kivas. Estes pacíficos
agricultores logo se tornam o objeto das atenções dos padres espanhóis,
impacientes por substituir o culto ao Pai Céu e da Mãe Terra por aquele de
cujo deus se bebe o sangue durante as cerimônias: os pajés índios são
acusados de bruxaria e executados. As Kivas são destruídas pelos militares
hispânicos. Os cultos religiosos tradicionais são proibidos, sob pena de
mutilação. Índios surpreendidos a celebrar uma cerimônia tradicional terão
um braço ou um pé cortados. Apesar disso tudo, alguns índios continuarão a
fazer os seus cultos, em segredo e à noite. Os padres católicos usarão esse
fato nos seus sermões e que os índios ainda hoje citam com amargura: os padres
diziam que a religião dos índios era a das trevas, pois era sempre à noite,
enquanto que o cristianismo era a religião da luz, pois se come a carne e se
bebe o sangue do deus cristão em pleno dia... Diversas revoltas sangrentas
pontuam a cristianização dos Pueblo. Essa perseguição religiosa só cessará
depois da anexação do território pelos EUA, em 1847.
Ano
de 1600
Giordano
Bruno é queimado vivo em Roma, condenado por heresia. Ele havia ousado definir
o Universo como infinito e admitido a hipótese da existência de formas de vida
fora da Terra. Era demais para a igreja. Depois de 8 anos de processo, durante o
qual lhe são arrancadas confissões, sob tortura, ele é condenado à morte
como "herege obstinado e ímpio". Ele se defende tentando mostrar que
as suas idéias não estão em contradição com as doutrinas cristãs, mas em
vão. Ele foi queimado vivo, em público, em Roma, no Campo dei Fiori. Tiveram o
cuidado de lhe cortar a língua antes de o enviar ao local da execução, para
evitar todo o risco de que as suas palavras não emocionassem a multidão que
veio assistir ao espetáculo. O seu principal acusador, o cardeal Bellarmino,
será mais tarde canonizado e em 1930, proclamado "Doutor da Igreja".
É
interessante notar que, se no caso de Galileu, a igreja católica expressou o
seu arrependimento no fim do séc. XX, com a sua reabilitação em 1992, nunca
se arrependerá da execução de Bruno. Pelo contrário, ela se opôs com
veemência à instalação duma estátua de Giordano Bruno, em 1889. Em 1929, o
papa pediu a Mussolini para que destruísse essa estátua, antes de canonizar e
depois nomear "Doutor da igreja" o cardeal Roberto Bellarmino,
acusador de Giordano Bruno.
Ano
de 1609
Expulsão
dos mouros de Espanha. Depois da expulsão dos judeus de Espanha, a inquisição
se aborrecia um pouco nesse belo país. Lança então a caça aos
"morescos", os árabes convertidos ao cristianismo. Há a suspeita de
serem falsos convertidos e são executados todos os que se recusam a beber vinho
ou comer carne de porco, ou que sejam limpos demais. Com efeito, o Islamismo,
contrariamente ao cristianismo, prescreve lavagens periódicas. A higiene nunca
foi tão perigosa como no séc. XVI em Espanha! Enfim, em 1609, temendo talvez
ter deixado passar alguns falsos convertidos, a inquisição consegue do rei a
expulsão dos "morescos" para o Norte da África. O número dos
expulsos é mal conhecido: as estimativas variam entre 300.000 e 3.000.000. Os
expulsos chegam a terras islâmicas, onde o Corão prevê a pena de morte para
os que renegaram Mahomé...
Ano
de 1633
Processo
de Galileu. Por ter duvidado da teoria geocêntrica de Ptolomeu, (que diga-se de
passagem, não era cristão), Galileo Galilei é obrigado a retratar-se:
são-lhe mostrados os instrumentos de tortura que seriam usados se ele
insistisse. O processo de Galileu só foi reaberto para revisão pelo papa João
Paulo II, e Galileu é reabilitado em 1992.
As
suas obras já tinham sido colocadas no Índex em 1616. Passará o resto da sua
vida confinado na sua casa (prisão domiciliar). Foi a sua reputação
internacional de cientista que lhe evitou consequências mais graves.
Anos
de 1618 a 1648
Guerra
dos 30 anos. Os muito católicos reis de Habsbourg, forçam a conversão dos
seus súbditos protestantes da Boémia, iniciando a maior guerra que o
continente europeu tinha conhecido. A população da Alemanha é reduzida à
metade. Numerosas cidades são devastadas. Epidemias de peste assolam toda a
Europa Central, desde a Lombardia à Prússia.
Trata-se
realmente duma guerra religiosa, embora as igrejas tenham tentado fazer crer que
se tratava dum conflito político: a guerra iniciou-se por conflitos religiosos
e pela ação de reis estrangeiros, como Gustavo II da Suécia, que intervieram
por razões de convicção religiosa. O caso de Gustavo II é particularmente
significativo, pois obrigava os seus soldados a cantar canções religiosas
todas as noites, embora eles fossem uns terríveis saqueadores. O exército
sueco ganhou o título de "Schrecken des Krieges", pela população
alemã, que teme a pilhagem dos suecos ainda mais do que as feitas pelos
exércitos dos Habsbourg.
Segunda
metade do séc. XVIII
O
assunto das reduções do Paraguai. Este caso é particularmente interessante,
pois aqui os católicos se massacram e se excomungam entre eles. Os jesuítas
haviam estabelecido no Paraguai um pequeno império particular feito de
reduções (redutos), ou seja pequenas aldeias fortificadas na floresta, onde
viviam os índios convertidos ao cristianismo, mas uma correção das fronteiras
coloca alguns desses redutos em território português. Ora, Portugal, país
católico e cristão, mantém na época a tradição da escravatura: os
portugueses pensam então roubar aos jesuítas os índios para depois vendê-los
como escravos.
O
papa intervém, excomunga os jesuítas das reduções. Depois, um exército, com
os canhões e espadas benzidas pelos padres de serviço, ataca as reduções,
massacra os jesuítas e toma os índios como escravos. Um Te Deum solene celebra
a vitória, como deve.
Pouco
depois o papa interdita a ordem dos jesuítas, culpada de ser muito inteligente
e racional, e sobretudo de não ter servido com lealdade a família de Bourbon,
reis de França e de Espanha, monarcas absolutos e grandes amigos da igreja
católica.
Ano
de 1766
Em
pleno século das luzes, um jovem de 19 anos, o Cavaleiro de la Barre, passa
"a vinte passos duma procissão, sem tirar o chapéu". É preso e
torturado. Finalmente é decapitado depois de lhe terem cortado a língua. O seu
corpo é depois colocado sobre uma fogueira e queimado junto com um exemplar do
Dicionário Filosófico de Voltaire, diante duma multidão entusiasmada.
Ano
de 1788
No
Cantão de Glaris, na Suíça, a última bruxa foi queimada.
Esta
execução da Inquisição não foi a última, e continuará queimando hereges
até 1826.
Ano
de 1793
Kant,
professor de Filosofia em Konigsberg e estrela internacional da filosofia
moderna, depois da publicação da "Crítica da Razão Pura", publica
"A religião nos limites da Razão", onde ele coloca as doutrinas
cristãs à prova do raciocínio e do "imperativo categórico". É
demais para os piedosos reis da Prússia, que empurrado pelos prelados
protestantes, intervém e Kant é forçado a retratar-se publicamente, sob pena
de perder imediatamente o seu posto na universidade de Konigsberg. Todos os
professores universitários são obrigados a assinar, sob pena de dispensa
imediata, um documento onde prometem não citar os ensinamentos de Kant com
relação à religião. Como no caso de Galileu, a fama internacional de Kant o
salva de consequências mais severas. Kant ainda pensa em se exilar, mas neste
fim de século, há poucos céus clementes para pensadores que ousaram criticar
aspectos da ideologia cristã. Assim acabará os seus dias em Konigsberg.
Ano
de 1826
O
último herege é queimado vivo, pela inquisição espanhola. Uma rica
tradição cristã termina. Daí para a frente, a igreja recorrerá a meios mais
sutis para matar, como proibir a assistência a mulheres que devem abortar,
sabotando o planejamento familiar nos países pobres, proibindo os preservativos
como modo de lutar contra a Aids-Sida, etc.
Ano
de 1847
Guerra
do Sonderbund. A Suíça é dilacerada por uma guerra religiosa. Os cantões
católicos, cujos governos estão muito influenciados pelos conselheiros
jesuítas, fundam uma aliança militar - o Sonderbund, que exige a anexação
aos cantões católicos de regiões maioritariamente protestantes. Chamam os
monarcas católicos da Áustria em seu auxílio, depois iniciam as hostilidades.
Somente uma vitória rápida das tropas federais/protestantes permitiu evitar
uma intervenção austríaca, que levaria a um conflito de extensão européia.
Os
protestantes por seu lado, encetam uma feroz "Caça aos católicos",
nos campos de Genebra.
Os
jesuítas, considerados responsáveis pela guerra, são expulsos da Suíça, e
essa expulsão valerá até 1970.
Ano
de 1848
A
população de Roma revolta-se contra a ditadura papal. O papa é expulso. Volta
ao poder em 1849, devido à ação das tropas francesas enviadas por Luís
Napoleão Bonaparte, presidente da república francesa. Os opositores são
fuzilados. O Estado da Igreja volta a ser uma monarquia absoluta, cujo soberano
é o papa.
Ano
de 1871
O
papa excomunga todo aquele que participar de qualquer eleição do estado
italiano, que é classificado como "diabólico", porque retirou aos
papas o seu poder temporal. Essa sentença de excomunhão automática não
impedirá o papa de abençoar, alguns anos depois, a fundação do "Partito
populare", de inspiração católica e fundado por um padre.
Ano
de 1881
Os
"Pogroms" russos começam. Incitados pelos prelados ortodoxos, que
difundiram um boato que o Czar Alexandre II teria sido assassinado por um judeu,
multidões se juntam em mais de 200 cidades russas e destroem os bens dos
judeus. Os pogroms tornar-se-ão comuns na piedosa Rússia Czarista, sobretudo
entre 1908 e 1917. O mais violento dentre eles teve lugar em Kishinev, em 1913:
as autoridades civis e religiosas da cidade incitam a multidão que ataca
violentamente os judeus. durante dois dias a multidão mata 45 judeus, fere 600
e pilha 1500 casas. Claro que os responsáveis (popes e políticos) nunca serão
incomodados pela justiça.
Ano
de 1889
Numa
Roma livre do jugo papal, no dia 9 de junho, é inaugurada a estátua de
Giordano Bruno, no Campo das Flores. O papa Leão XIII, sofredor, passará o dia
todo de jejum aos pés da estátua de S. Pedro. A imprensa católica dispara:
fala de "orgia satânica", descrevendo a manifestação da
inauguração, o "triunfo da sinagoga, dos arquibandidos da Maçonaria, dos
chefes do liberalismo demagógico", "o máximo da ignorância e da
malignidade anti-clerical".
Anos
de 1918 a 1945
Os
anos do compromisso. A igreja católica apóia ativamente o crescimento dos
totalitarismos na Europa. Na Áustria, o seu apoio ao Austro-Fascismo é total.
Na Itália, ela assina com o regime fascista uma concordata que faz do
catolicismo a religião de estado: os italianos podem de novo votar sem serem
excomungados, pena que isso de pouco serve em período de ditadura. A igreja
sacrifica em grande parte as suas próprias associações: todas, exceto a
Ação Católica, devem integrar as organizações fascistas. O Vaticano promete
a Mussolini de fazer com que a AC não se deixe tentar por ações
antifascistas.
Em
1929, Mussolini, depois de ter assinado a concordata dita "Patti
Lateranensi", é qualificado pelo papa como "o homem da
providência". Em 1932, o ditador recebe das mãos do papa, a Ordem da
Espora de Ouro, que é a mais alta distinção concedida pelo Estado do
Vaticano.
Essa
bela harmonia vai resistir mesmo ao momento de tensão causado pela estátua de
Giordano Bruno. O papa aproveita a concordata para pedir ao seu amigo ditador
que destrua a estátua erigida em 1889. O ditador, que tem um filho com o nome
de Bruno, toma a defesa do livre-pensador e declara à Câmara de Deputados
"A estátua de Giordano Bruno, melancólica como o destino desse monge,
ficará onde ela está. Tenho a impressão que seria se encarniçar contra esse
filósofo que, se equivocado e persistiu no erro, no entanto já pagou".
Para mostrar que não se arrepende de nada, a igreja canoniza então Roberto
Bellarmino, o acusador de G. Bruno, nomeando-o "Doutor da Igreja".
Na
Alemanha, em janeiro de 1933, o Zentrum, partido católico, cujo líder é um
prelado católico (Pralat Kaas), vota plenos poderes para Hitler: este último
pode assim atingir a maioria de dois terços necessária para suspender os
direitos garantidos pela Constituição. Com uma caridade toda cristã, o bom
prelado aceita também fechar os olhos para os discutíveis processos nazistas,
como a prisão dos deputados comunistas antes da votação. Depois a igreja
começa a negociar uma nova concordata com a Alemanha: nesse cenário, ela
sacrifica o Zentrum, então o único partido significativo que os nazistas não
tinham proibido. Na realidade ele tinha-o ajudado a chegar ao poder. Em 5 de
julho de 1933, o Zentrum se dissolve sob solicitação da hierarquia católica,
deixando o caminho livre para o NSDAP de Hitler, então partido único.
Hitler
declara-se católico no "Mein Kampf", o livro onde ele anuncia o seu
programa político. Também afirma que está convencido ser ele um
"instrumento de deus". A igreja católica nunca colocou no seu Índex
o "Mein Kampf", mesmo antes da ascensão de Hitler ao poder. Podemos
acreditar que o programa anti-semita do futuro chanceler não desagradava à
igreja. Hitler mostrará o seu reconhecimento tornando obrigatória uma prece a
Jesus nas escolas públicas alemãs, e reintroduzindo a frase "Gott mit
uns" (Deus está conosco) nos uniformes do exército alemão.
Em
1938, as SS e SA organizam a "Noite de Cristal": com trajes civis, os
milicianos nazistas atacam sinagogas e lojas pertencentes a judeus. A
população alemã está horrorizada e aterrorizada. O bispo de Freiburg,
monsenhor Gröber, declara então, em resposta às perguntas sobre as leis
racistas e os pogroms da noite de cristal: "Não podemos recusar a ninguém
o direito de salvaguardar a pureza da sua raça e de elaborar medidas
necessárias a esse fim".
Na Espanha, um general tenta um golpe de estado militar, que aborta mas degenera
em guerra civil. A igreja o apoia, padres e bispos benzem os canhões de Franco,
celebram com muita pompa Te Deum pelas suas vitórias contra o governo
republicano legítimo. A guerra faz mais de um milhão de mortos, e Franco
fuzila todos os prisioneiros. Franco se mostrará reconhecido por seus piedosos
aliados, nomeando diversos membros da Opus Dei para o seu governo. A influência
da Opus Dei crescerá ao longo da ditadura franquista, ao ponto de se chegar a
mais de metade dos ministros serem membros dessa venerável instituição
católica.
Na
França, a igreja declara, desde 1940, que "Petain é a França": ela
prefere de fato o Trabalho-Família-Pátria do estado francês às
Liberté-Égalité-Fraternité da República, que sempre a horrorizaram.
Durante
a 2a guerra mundial, o Vaticano estava ciente do extermínio
dos judeus pelos nazistas. Saber-se-á, após a guerra, que o papa diversas
vezes esteve para fazer um pronunciamento público, mas que finalmente se
absteve essencialmente pela sua comunistofobia e achando que uma vitória russa
seria "pior". No entanto ele chorou em 1942, junto às ruínas de
Roma, bombardeada pelos aliados. Também ele se esquece de mencionar que o seu
aliado político Mussolini tinha solicitado a Hitler para ter "a honra de
participar dos bombardeamentos sobre Londres", é verdade que o papa não
habitava em Londres...
Ano
de 1948
O
papa declara que todo aquele que votar nos comunistas ou que ajudar esse partido
de qualquer maneira, será automaticamente excomungado. Essa medida divide as
famílias, provoca exclusões socialmente intoleráveis para muitos e obriga à
clandestinidade de numerosos comunistas nas zonas rurais.
Os
curas italianos apressaram-se a traduzir essa decisão em fatos, e pedem que as
suas ovelhas votem no grande partido anticomunista (DC - Democrazia Cristiana).
O partido DC vai-se afundar logo em seguida na corrupção generalizada nos anos
90.
Ano
de 1961
Última
edição do índex (Índex Additus Librorum Prohibitorum), que cita como autores
cujas obras são proibidas de leitura pelos católicos entre outros: Jean-Paul
Sartre, Alberto Moravia, André Gide.
Anos
80
Depois
de um período de aparente liberalização, o papa João Paulo II chega à
cabeça da maior seita do mundo e rende-se às mais terríveis tradições da
igreja.
A
sua condenação do preservativo, como modo de luta contra a Aids-Sida, provoca
um grande número de mortos, difícil de estimar. Pratica uma política ativa de
sabotagem às medidas de controle da natalidade no terceiro mundo. As
consequências são difíceis de contabilizar, mas podem-se medir em termos de
fome, miséria, criminalidade e falta de assistência médica nos continentes
mais pobres - América do Sul e África.
Na sua caça aos hereges, o papa suspende "A divinis", dois teólogos alemães que tinham ousado duvidar, um da infalibilidade papal e outro da imaculada concepção de Maria.
Na sua caça aos hereges, o papa suspende "A divinis", dois teólogos alemães que tinham ousado duvidar, um da infalibilidade papal e outro da imaculada concepção de Maria.
Anos
90: guerras de religião na Iugoslávia
A
Iugoslávia era, nos anos 80, uma das terras favoritas para férias balneares
dos europeus. A publicidade iugoslava da época vendia o caráter multireligioso
do país como um argumento turístico, pois se podia ver em Mostar e em outras
belas cidades, as mesquitas e as igrejas lado a lado. Mas o país se afundou
numa série de guerras civis que se querem descrever como guerras
"étnicas", quando na verdade se trata de guerras religiosas. O caso
da guerra da Croácia é o mais flagrante. Sérvios e croatas têm a mesma
origem étnica e até a mesma língua, o Croata-servo. O mais irônico é que o
croata-servo (servo-croata, escrito em caracteres latinos), é hoje a língua
oficial dos soldados do exército Iugoslavo que combateu em Kosovo contra a
OTAN, depois de ter lutado contra os croatas no início dos anos 90. Mas a
religião separa os croatas dos Sérvios: os croatas foram cristianizados por
Roma e são católicos. Os sérvios foram cristianizados pelos bizantinos e são
ortodoxos. Quando Milosevitch começa a agitar o espectro da "Grande
Sérvia", a Croácia declara a independência. Imediatamente o Vaticano e a
R. F. da Alemanha cujo chanceler se declarava um católico convicto, reconhecem
a Croácia católica como estado independente. O Vaticano mandou para todo o
mundo anúncios para que os países reconhecessem o novo estado católico. O
papa multiplica os apelos, as preces e as missas pela independência da
Croácia. Durante esse tempo, o ditador croata, antigo oficial superior do
regime comunista e também católico praticante, deu férias para todos os seus
funcionários ortodoxos, isto é, sérvios. Depois escolheu como bandeira
nacional a antiga insígnia dos Oustachis, que entre 1940 e 44 tinham praticado
um genocídio de cerca de 600.000 sérvios. A guerra civil iniciou-se.
Finalmente
termina essa guerra, e o papa beatifica o cardeal Stepinac que havia qualificado
Ante Palevitc, o ditador Oustachi durante a ocupação de 1940/44, de "Dom
de deus", para a Croácia e o havia apoiado ativamente.
A
guerra da Iugoslávia continuou depois na Bósnia, onde os membros dos três
grupos religiosos (ortodoxos, muçulmanos e católicos) se enfrentaram em uma
série de combates triangulares, tendo a população civil como a principal
vítima. Depois a guerra passou para o Kosovo, província agrícola sem
interesse estratégico, e todos sabemos o que se passou.
As
guerras da Iugoslávia são um caso emblemático da catastrófica intolerância
que é típica das religiões "reveladas": as comunidades religiosas
se enfrentam, neste final de século, em nome de religiões que elas receberam
dos acasos da expansão dos diversos impérios (Romano, Bizantino e Otomano)
desde a idade-média.
***
Notas
do Tradutor (Cassy Beski)
1
- Que falta de conhecimentos sanitários!
2 - Para evitar problemas de herança, dos bens da Igreja.
3 - ...do Maranhão, é esse mesmo!
4 - Dominicanos e franciscanos dominavam a Inquisição.
5 - No Brasil também interditou e puniu diversos padres mais ousados, como Leonardo Boff.
2 - Para evitar problemas de herança, dos bens da Igreja.
3 - ...do Maranhão, é esse mesmo!
4 - Dominicanos e franciscanos dominavam a Inquisição.
5 - No Brasil também interditou e puniu diversos padres mais ousados, como Leonardo Boff.
Retirado
do site http://geocities.com/realidadebr/textos/paginanegra.htm
Fonte: Uma Nova Era
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